BIBLICAMENTE, QUAL A FUNÇÃO DO DIÁCONO NA IGREJA?

A diaconia tem sido, ao longo da história recente das igrejas evangélicas, motivo de controvérsias, pela falta de um conhecimento bíblico claro sobre o ministério diaconal. As controvérsias são consequência da falta de treinamento dos diáconos e de desconhecimento ou distorção do que a Bíblia diz, em algumas denominações. Frequentemente vemos diáconos sendo consagrados sem que estes saibam qual a importância do seu ministério e o que ele deve fazer como diácono, a fim de que seja capaz de cumprir o propósito previsto na Palavra de Deus, quando o diaconato foi instituído. 

O ministério diaconal foi instituído no início da igreja primitiva com o propósito de resolver um problema decorrente do crescimento do número dos discípulos, que provocou murmurações dos gregos contra os judeus, porque suas viúvas estavam sendo esquecidas na distribuição diária de alimentos (Atos 6:1).

Na época dos cristãos primitivos, a viuvez entre os judeus, representava grave problema social, pelo fato de que as mulheres não exerciam qualquer atividade profissional remunerada e também não havia sistema previdenciário. A perda do marido, inevitavelmente levava as viúvas a dependerem da solidariedade pública para sobreviveram. Dentro deste contexto social, a igreja primitiva exercia um papel preponderante de assistência humanitária.

Diante desta realidade, os apóstolos entenderam que cuidar das viúvas e dos demais necessitados, era para eles uma carga que não conseguiriam dar conta sozinhos. O cuidado das mesas prejudicava o exercício da função pastoral dos apóstolos que era "dedicar-se ao ensino da palavra de Deus e a oração". Com este entendimento, eles convocaram a multidão dos discípulos, fazendo-lhe uma proposta: "escolham, pois irmãos, dentre vocês, sete homens, de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria, para que os encarreguemos de atender a estas necessidades de assistência social, a fim de que possamos perseverar na oração e no ministério da Palavra" (Atos 6:2-4). Assim surgiu o ministério da diaconia na igreja primitiva. Naquele momento, foram eleitos os primeiros diáconos “Estevão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, Felipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Parmenas e Nicolau” (v. 5).

Para falarmos do ministério da diaconia, vamos primeiro saber o significado da palavra “diácono”. O termo vem do grego “diákonos”, que significa literalmente “servo”, “atendente”[1]. O diácono, nada mais é que um servo, um atendente dos enfermos, necessitados e dos que precisam de apoio espiritual dentro da comunidade que chamamos de igreja. A liderança eclesiástica, a pregação da Palavra e o ensino não fazem parte do serviço diaconal. Fazendo uma analogia com o serviço dos levitas no tabernáculo, no antigo testamento[2], poderemos ainda afirmar que também é papel dos diáconos cuidar da manutenção da estrutura do templo, organizar os espaços de cultos, cuidar da ordem no templo, preparar os elementos (pão e cálice) e servir a ceia do Senhor, assistir a aqueles que por algum motivo necessitem de ajuda durante os cultos e outros eventos na ecklesia, colaborar no recolhimento dos dízimos e ofertas durante os cultos e auxiliar os pastores.

É justamente esta falta de compreensão clara do papel dos diáconos que faz com que estes não exerçam de fato o serviço de diaconia proposto pelos apóstolos, quando da instituição deste ministério (Atos 6:1-4). Muitos são consagrados diáconos sem saber, exatamente, o que deve fazer e como seu serviço vai contribuir na busca de solução para os conflitos internos da igreja, decorrentes das necessidades que surgem com o crescimento do número de discípulos. Esta negligência, às vezes involuntária, é resultado da falta de conhecimento claro sobre a importância do ministério diaconal na vida da igreja, tanto por parte dos diáconos quanto de pastores que os consagram. Vale, contudo, destacar que dentre os serviços elencados no parágrafo anterior, o mais importante deles é servir as mesas dos necessitados, dos enfermos e da igreja. É bom sempre lembrar que o diácono é, biblicamente, um assistente do pastor, no atendimento às demandas sociais da comunidade.

O ministério diaconal não tem como propósito servir de trampolim para ascensão a outros ministérios. Servir como diácono é um dom, uma missão tão importante quanto servir como pastor. Há líderes de muitas denominações evangélicas que consagram diáconos sem avaliar se eles têm um chamado para exercer a função, um dom dado por Deus (Romanos 12:7). Outros consagram com o intuito de projetar pessoas para cargos mais elevados na hierarquia eclesiástica. Biblicamente os ministérios não seguem uma hierarquia. Reafirmamos, o ministério diaconal é tão importante quanto o ministério pastoral. Na lógica de Jesus quem quiser ser senhor terá que ser servo (João 13:14; Marcos 10:43-45). Na perspectiva do Senhor, tanto os pastores quanto os diáconos deverão ser servos, nada mais que isto. Ninguém foi chamado para ser servido, mas para servir. É o que chamamos de liderança servidora. É neste viés que Paulo iguala as qualificações dos bispos[3] e diáconos.

⁸ Do mesmo modo, quanto a diáconos, é necessário que sejam respeitáveis, de uma só palavra, não inclinados a muito vinho, não gananciosos, ⁹ conservando o mistério da fé com a consciência limpa.¹⁰ Também estes devem ser primeiramente experimentados; e, caso se mostrem irrepreensíveis, que exerçam o diaconato. ¹¹ Do mesmo modo, quanto a mulheres, é necessário que elas sejam respeitáveis, não maldizentes, moderadas e fiéis em tudo. ¹² O diácono seja marido de uma só mulher e governe bem os seus filhos e a própria casa. ¹³ Pois os que desempenharem bem o diaconato alcançarão para si mesmos uma posição de honra e muita ousadia na fé em Cristo Jesus. (1 Timóteo 3:8-13).

Com o objetivo de criar hierarquias e definir níveis de importância e prestígio, como acontece nas administrações das empresas e órgãos públicos, líderes criam uma aberração eclesiológica, torcendo o texto bíblico que diz: “¹¹ E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores,” (Efésios 4:11). O texto não fala de cargos ministeriais, mas de dons (Efésios 4;8). A igreja primitiva e o apostolo Paulo somente reconhecem dois ministérios - pastores (no caso da igreja primitiva, os apóstolos) e diáconos (Atos 6:1-4; 1 Timóteo 3:1-13). Todos os outros ministérios que vemos hoje, principalmente em igrejas neopentecostais, são definições humanas, à revelia do que nos ensina a Bíblia, a palavra de Deus, com o objetivo de criar um organograma eclesiástico por nível de hierarquia. Estes organogramas definem quem é maior ou menor dentro da estrutura de poder e chocam-se frontalmente com a perspectiva de Jesus de que fomos chamados para servir (Filipenses 2:3-5).

Não estamos afirmando que os diáconos não podem almejar o ministério pastoral, mas que não é saudável usar o ministério diaconal como trampolim para voos mais altos no organograma de poder eclesiástico. Biblicamente igreja não possui organograma. Paulo disse que “¹ se alguém deseja o episcopado, excelente obra deseja.” (1 Timóteo 3:1). Se servir como diácono é um dom (Romanos 12:7), pastorear também o é (Efésios 4:11). Há pessoas a quem Deus entrega mais de um dom ao longo da sua caminhada cristã. Ter um dom ou mais de um é graça de Deus, não há como explicar. Estevão o primeiro mártir da fé cristã e, exercendo o diaconato, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo (Atos 6:8) e se mostrou poderoso no conhecimento das Escrituras Sagradas (Atos 7:1-60). Servir como diácono é uma benção, desde que o que serve reconheça que é um servo de Deus e da sua igreja. Nenhum diácono deve assumir atividades exclusivas aos pastores como: batismo, celebração da ceia do Senhor, ordenação de pastores e diáconos, etc. (1 Samuel 13:13-14). É preciso saber que é bíblico a existência de um delimitador de atividades entre pastores e diáconos (Atos 6:2-4). Quem harmoniza e torna frutífero e edificador o trabalho de ambos é a humildade. Paulo nos ensina dizendo:

³ Nada façam por ambição egoísta ou por vaidade, mas humildemente considerem os outros superiores a si mesmos. ⁴ Cada um cuide, não somente dos seus interesses, mas também dos interesses dos outros. ⁵ Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, ⁶ que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; ⁷ mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. (Filipenses 2:3-7 - NVI).

Outro tema relacionado à diaconia em aberto é a consagração de mulheres ao ministério diaconal. Ainda há dúvidas e questionamentos sobre o assunto. O termo diaconisa não existe na Bíblia. Entretanto, é muito provável que mulheres tenham servido como diaconisa na igreja primitiva. Em Romanos 16:1, Paulo se refere a Febe, como serva da igreja em Cencreia. Aqui o termo serva, no original grego é “diakonos”, a mesma palavra utilizada pra referir-se aos diáconos. No versículo 2 ele destaca o trabalho dessa mulher, que é o trabalho próprio do diácono.

Embora ainda haja resistência em muitas denominações evangélicas em aceitar as mulheres como diaconisas, se fizermos uma análise detida no texto de 1º Timóteo 3:11, vemos que Paulo, falando de diáconos, diz que as mulheres devem ter as mesmas credenciais dos homens. Vejamos o texto - ¹¹ Do mesmo modo, quanto a mulheres, é necessário que elas sejam respeitáveis, não maldizentes, moderadas e fiéis em tudo.” (1 Timóteo 3:11-NAA). O termo aqui não tem qualquer referência às esposas dos diáconos, mas às diaconisas.

Concluindo podemos afirmar que, biblicamente, a função do diácono é: cuidar dos bens materiais da igreja; da ordem e da disciplina no culto; servir às mesas dos necessitados e da igreja; assistir aos enfermos e; desenvolver trabalhos voltados para a assistência social da comunidade no cumprimento do propósito da igreja local.

 

Pr. Gilvan de Sousa
Aracaju - SE

 



[1] Diccionario Expositivo de Palabras del Nuevo Testamento. Barcelona, 1984.

[2] Os levitas não eram diáconos, o termo diácono somente está presente no Novo Testamento, entretanto, as funções dos levitas no Antigo Testamento se assemelham às dos diáconos (Números 1:50-51).

[3] Bispos, pastores e presbíteros são palavras sinônimas, não há nelas níveis hierárquicos.

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